Mudanças climáticas e avanço da soja impactam produção de alimentos e elevam preços, aponta FGV

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A desaceleração no crescimento da produção de alimentos no Brasil tem pressionado os preços da comida e impulsionado a inflação do setor acima da média geral do país. Essa é a principal conclusão da Carta do Ibre, análise econômica mensal publicada pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Assinado pelo economista Luiz Guilherme Schymura, o estudo aponta que mudanças no uso da terra e eventos climáticos extremos dificultam o equilíbrio entre produção e demanda alimentar. Entre 2012 e 2024, os preços dos alimentos subiram 162%, enquanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve alta de 109%. Em fevereiro deste ano, a inflação de alimentos e bebidas acumulou 7,25% em 12 meses, acima da inflação geral, que foi de 4,56%.

Impacto do clima e da desvalorização do real

O Ibre destaca que eventos climáticos severos e a crescente imprevisibilidade do tempo afetam a produção agrícola global, impactando diretamente o Brasil. O aumento da temperatura e fenômenos extremos, como secas prolongadas e chuvas irregulares, reduzem a produtividade e elevam os custos de produção.

Outro fator que encarece os alimentos é a desvalorização do real, que incentiva as exportações e torna o mercado externo mais atrativo para os produtores. Com mais produtos destinados ao comércio internacional, a oferta interna diminui, pressionando os preços. Além disso, a cotação do dólar eleva o custo de insumos importados, como fertilizantes e defensivos agrícolas.

Redução na oferta de alimentos

A publicação da FGV mostra que a área plantada no Brasil cresceu de 65,4 milhões de hectares em 2010 para 96,3 milhões em 2023, mas esse avanço se deve, principalmente, às culturas de soja e milho, voltadas à exportação. Sem essas commodities, a área destinada à produção de alimentos básicos se manteve praticamente estável, passando de 29,1 milhões de hectares em 2010 para 29,3 milhões em 2023.

Entre os alimentos mais afetados, o estudo destaca a redução na produção de arroz e feijão. O cultivo de arroz caiu de 2,8 milhões de hectares em 2010 para 1,6 milhão em 2024, enquanto a produção per capita de feijão registrou queda de 20% desde 2012.

O estudo também aponta que a produção por habitante de quase todas as principais frutas caiu no Brasil. A produção de banana recuou 10%, laranja, 20%, mamão, 40% e tangerina, 8%. Apenas a uva teve crescimento, com alta de 9%.

Pressão sobre carne e hortaliças

O encarecimento da carne também tem relação com a menor oferta no mercado interno. Segundo a FGV, desde 2017 houve um grande aumento nas exportações, enquanto a produção nacional se manteve estável. Como consequência, a disponibilidade de carne bovina para consumo doméstico caiu de 39,9 kg por habitante em 2017 para 36,1 kg em 2023, o menor nível desde 2013.

No caso das hortaliças e verduras, que acumulam alta de 246% desde 2012, o estudo sugere que o crescimento da demanda por alimentos mais saudáveis pode estar contribuindo para a elevação dos preços. Além disso, o avanço das áreas urbanas sobre os chamados “cinturões verdes” e o aumento do custo da mão de obra também dificultam a produção.

Medidas para conter a alta dos alimentos

A Carta do Ibre conclui que a alta dos alimentos não é um fenômeno passageiro e propõe ações para mitigar os impactos da inflação alimentar. Entre as recomendações estão o monitoramento da produção, recomposição de estoques públicos, ampliação da infraestrutura de armazenamento e melhoria das vias de escoamento.

O estudo ressalta que não se trata de restringir as culturas de exportação, como soja e milho, que trazem benefícios econômicos ao país. No entanto, é necessário estimular a produção de alimentos voltados ao consumo interno para equilibrar a oferta e evitar pressões excessivas sobre os preços.

O governo federal já tomou medidas para conter a alta da comida. Na última semana, zerou o Imposto de Importação de nove alimentos na tentativa de reduzir os preços. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aposta ainda na supersafra de 328,3 milhões de toneladas de grãos esperada para 2024/25 como fator de alívio na inflação alimentar.

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